Workshop discute uso da água na agricultura

Data: 18/03/2015
Fonte: Unesp
Seca foi um dos temas do evento com cientistas do Brasil e da Grã-Bretanha
A Unesp e o Consulado Britânico realizaram um workshop de 10 a 13 de março sobre o uso da água na agricultura e suas implicações sociais, ecológicas, políticas e econômicas. A plateia, formada por cientistas do Brasil e de diversas instituições de ensino do Reino Unido, estabeleceu uma estratégia de cooperação para realização de trabalhos em colaboração e inscrições conjuntas para financiamentos de pesquisa nos dois países. A atual crise hídrica no estado de São Paulo foi um dos destaques do evento.

Intitulado “Water as the Frontier of Agrobusiness: Político-Ecological and Sócio-Economic Connections From Farms to Global Markets”, ou “Água como o limite do Agrobusiness: Conexões Político-Ecológicas e Sócio-Economicas das Fazendas para os Mercados Globais”, o encontro foi custeado com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e o britânico Newton Found. José Gilberto de Souza, da Unesp em Rio Claro, e Antônio Ioris, professor da Universidade de Edimburgo, na Escócia, coordenaram a iniciativa.

Na abertura do encontro, a pró-reitora de Pesquisa da Unesp, Maria José Soares Mendes Giannini, reforçou que o tema é de fundamental importância para o Estado de São Paulo e lembrou ainda que a Universidade tem dado prioridade à internacionalização. “Cerca de 75% da produção científica atual da Unesp registrada na base de dados Scimago foi feita em cooperação com instituições do exterior”.

Na primeira apresentação do Workshop, Ioris enfatizou a necessidade de investigar as crises hídricas para além de fatores climáticos e meteorológicos. “Os estudos mais atuais sobre falta de água no mundo têm reforçado que as principais razões para a escassez estão ligadas a circunstâncias políticas, sociais e econômicas”, disse.

“É preciso também discutir a dimensão humana e até simbólica da água mesmo quando tratamos de temas eminentemente econômicos, como as estratégias de pagamentos por serviços ambientais”, afirmou Souza.

Crise no Sudeste
Sérgio Rezera, diretor da Agência Reguladora das Bacias do PCJ, referente aos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, fez uma apresentação com foco na atual crise hídrica. Ele explicou que atualmente as bacias abastecem 5,9 milhões de habitantes de cidades da região e mais 5 milhões, aproximadamente, na Região Metropolitana de São Paulo, por meio do Sistema Cantareira. “Estamos falando de um percentual significativo do PIB nacional”, disse.

O diretor explicou que não é simples determinar o impacto da agricultura no uso da água em São Paulo porque sempre foi difícil detectar os usuários rurais. Segundo Rezera, são estimados mais de 17 mil no PCJ, sendo que apenas 150 estavam legais até 2013. De acordo com ele, a estiagem levou alguns produtores a tomarem a iniciativa de formalizar sua captação de água, no sentido de obter dos governos alguma garantia de acesso aos recursos hídricos. “Também por conta da crise criamos o programa Pacto pela Água, que intensificou a fiscalização e deu incentivos aos produtores para que buscassem a outorga”, explicou. “Assim, conseguimos cadastrar 950 usuários, número ainda pequeno, mas que indica que estamos num caminho correto.”

Ele destaca que embora a região esteja enfrentando problemas de disponibilidade hídrica, as bacias do PCJ têm a mais avançada regulamentação do país, com um sistema de cooperação que envolve os comitês de Minas Gerais, São Paulo e do governo federal. “Somos os únicos a implementar determinadas medidas voltadas para o uso racional e produção de água, como a cobrança pelo uso da água e o pagamento por serviços ambientais”, salientou.

O exemplo da Califórnia
A crise hídrica da Califórnia, nos EUA, foi o tema de palestra do professor Clifford Andrew Welch, da Unifesp, câmpus de Guarulhos. Em sua fala, ele descreve a organização National Land for People que teve destaque nos anos 70 e 80 por sua luta reforma agrária naquele estado norte-americano. O principal fator de mobilização, segundo o pesquisador, que nasceu na Califórnia, era o monopólio do uso da água pelos grandes produtores rurais.

“Hoje, o Vale Central é uma região desolada, totalmente devastada pelo uso exaustivo dos recursos hídricos no agronegócio”, diz, se referindo à região formada pelo encontro dos vales dos rios Sacramento e San Joaquin, onde regulações para preservação dos cursos de água não são cumpridas. O professor explica que o local corresponde a 25% da produção agrícola doa EUA, com predominância das monoculturas do algodão, de amêndoas e uva. “Há uma enorme pressão econômica por parte dos grandes proprietários, que dizem que mudanças no uso da água trariam desemprego e pobreza”, conta. “Mas o fato é que as regiões rurais da Califórnia têm baixíssimos índices de desenvolvimento humano, não geram ocupações qualificadas e deixam inquestionável passivo ambiental, com impactos em bacias que vão além das fronteiras americanas.”

Esse cenário, conforme Welch, afeta grandes cidades do estado, como São Francisco e Los Angeles, que obedecem a uma rígida política de restrição de água. “Entendo que a recuperação de mananciais e áreas de produção seja uma solução para mitigar esses impactos”. O professor encerrou a fala com imagens de satélite da Serra Nevada onde a diminuição drástica da neve é evidente, fato que, segundo seu pensamento, está diretamente ligado à exaustão dos recursos hídricos naquela área.

Visitas
O evento incluiu ainda palestras de Dominic Moran, do Scotland s Rural College (SRUC), que falou sobre o valor econômico da água; Robert Fish, da Exeter University, abordando aspectos políticos e ecológicos da interação entre a água e os diversos usos da terra, em meio ao que ele chamou de “era dos serviços ecossistêmicos”; Bernardo Mançano Fernandes, da Unesp em Presidente Prudente, que descreveu a relação entre o desenvolvimento rural brasileiro e suas relações com os movimentos sociais de luta pela terra; e o geógrafo Ariovaldo Umbelino Oliveira, da USP, que discutiu com o público as perspectivas da agricultura e do agronegócio no Brasil.

Na sexta-feira, 13/03, os participantes do workshop foram a universidades e centros de pesquisa do Estado de São Paulo e à sede do Comitê PCJ.



< voltar